Tenho feito aulas de alemão toda manhã. Acordo às seis e meia, como, pego o bonde e vou embora. Só volto depois do meio-dia. Cansativo, mas curiosamente intenso. A língua alemã é muito maluca. Muito mais complexa que o inglês, mas por outro lado tem uma lógica estrutural bem interessante. As coisas têm lugar certo, e dependendo de como são usadas são flexionadas de forma diferente. Substantivos são uma coisa, nomes próprios são outra - Nomen e Namen, mas todos eles são escritos sempre com maiúsculas. A ordem das frases é rígida, então eu posso dizer que eu aprendo na Inlingua alemão, mas não posso dizer que aprendo alemão na Inlingua ou que na Inlingua aprendo alemão. O primeiro verbo fica sempre na segunda posição da frase, o segundo verbo (quando há) fica sempre na última. A onda de poder juntar palavras pra explicar uma idéia me faz pensar no Borges pirando naquelas metáforas da Volsunga Saga ou quando ele discorre no Tlön, Uqbar e Orbis Tertius sobre uma das línguas do planeta lá, em que não existem verbos (BolaGrandeFogoCéu pra explicar o sol, e por aí vai).
Interessante também no curso de alemão é o bando de gente do mundo todo que tem por lá - colombiano, italiano, uns ex-russos e os orientais. Um alemão um dia desses me fez entender que, obviamente, até a reunificação, a Alemanha Oriental não recebia imigrantes turcos ou portugueses como o lado Oeste, só russos, cubanos e vietnamitas. E me liguei que tem mesmo uma pá de restaurante vietnamita por aqui. Herança vermelha, daquele jeito. Ainda não aprendi nada de russo, tô me concentrando no alemão, mas pretendo. Tem uma adega só com bebidas russas perto de casa.
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Neste exato momento tô sentado em uma árvore caída no meio de um bosque alemão. Desde a estrada até aqui foram uns quinze minutos de trilha, e fiquei no caminho pensando naqueles bosques de história infantil. Não saia da trilha pois o Lobo Mau passeia aqui por perto, deixe migalhas de pão para lembrar do caminho, não fale com as Raposas. Um bando de alemães de bicicleta passou por mim, e um deles deu uma risada e perguntou se eu tinha perdido a minha bicicleta, Fahrrad. Sorri e mandei à merda e ele não entendeu. Não achei nenhum rio aqui nesse bosque, mas o vento nos pinheiros já traz um pouco de clima daquela mata subtropical de Cunha.
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Passear pelos bairros mais afastados da cidade me faz lembrar das visitas a parentes em Venâncio Aires ou Anta Gorda. Casinhas com vigas de madeira, jardins floridos e cheirosos, ruas limpinhas, bando de loirinhos e loirinhas caminhando pelas ruas e estranhando forasteiros.
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Rolou meu papel, tenho visto até dezembro, com algumas condições - continuar estudando alemão 20 horas por semana e não pedir recursos públicos. O curso não é barato, mas vou experimentar cabular um mês e ver no que dá. E já vou começar a agitar pra depois um visto mais longo e mais fácil de cumprir.
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Bricolabs tá uma massa de modelar sem criança. Vou ver se começo algo por lá. Também tô rascunhando o sempre atrasado livro sobre MetaReciclagem. Alguém aí quer me bancar pra fazer isso
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O friozinho que me permitia tirar onda do "verão" alemão acabou. Ontem chegou aos trinta graus, e a gente saiu em busca de uma segunda bicicleta (já descolamos uma megafodona por 50 euros com o vizinho de baixo, agora falta a outra). Não achamos bicicleta, mas conhecemos um parque novo e acabou que caímos no meio de uma festa de vinhos. Provamos uns cinco ou seis e saímos de lá meio que tropicando, com uma garrafa. Tinha bandinha alemã tocando. Ruim como as bandas gaudérias, aquele ar canastrão metido a engraçado. Um mendigo barbudo tava doidão lá, dançando ao som dos caras. Ainda deitamos um pouco no gramado à beira do Elba e voltamos ébrios para casa.
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Sexta-feira demos uma passada na Pfunds, que garante ser a melhor leiteria do mundo. Acho que nunca fui em outra leiteria, então não posso afirmar o mesmo. O ambiente é maluco, todas as paredes de azulejos, o teto pintado. Dá pra comprar um copo de leite fresco. Pegamos também um Camembert com pimenta, que não durou duas horas em casa. Não ficamos muito tempo, chegou um caminhão lotado de turistas alemãs gordas e a gente saiu correndo. Paramos pra beber algumas Carlsbergs num boteco espanhol, e ainda passamos no supermercado pra pegar umas Budvar pra beber em casa. No fim da quarta cerveja, capotei, tonto e feliz.