Um prego no caixão da democracia

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Rodrigo Alvares, o último membro da orquestra a abandonar o navio, decidiu hoje encerrar o blog A Nova Corja. Por um ou dois anos fui membro da trupe, certamente um dos menos dedicados, mas pude ao menos compartilhar a alegria de fazer reportagem política incondicional, no melhor estilo “jornalismo é oposição, o resto é balcão de secos e molhados”. Desejo a todos os jornalistas que tenham essa experiência ao menos uma vez na vida.

O motivo principal para o encerramento das operações é o desânimo causado pelos processos de Políbio Braga, Felipe Vieira e Banrisul. Não que os processos metessem medo. O problema é que eles custam dinheiro, mesmo quando o juiz decide a seu favor, e, principalmente, tomam muito tempo. Todos os membros atuais e antigos da Corja têm empregos e famílias para cuidar. O jornalismo político era algo como uma prestação de serviços à sociedade, um voluntariado. Quando os poderosos foram perturbados e resolveram se aproveitar do Judiciário para tentar calar a Corja, porém, a sociedade mostrou-se incapaz de ajudar. O tempo livre antes dedicado ao jornalismo passou a ser dedicado a defender-se da litigância de má-fé. Algumas famílias até mesmo sofreram ameaças.

Algumas lições importantes podem ser tiradas desse caso. Primeiro, percebe-se que o bom jornalismo ainda faz diferença. A luz do dia incomoda aos poderosos e, no contexto da comunicação em rede mediada por computador, está ao alcance de qualquer cidadão expor os fatos ao sol. É o que chamo de webjornalismo cidadão, uma prática cada vez mais incensada como panacéia para os problemas do jornalismo. Pois bem, esse caso mostra os limites do webjornalismo cidadão.

Expostos ao sol, os políticos e sua entourage costumam sentir-se acuados e apelam ao Judiciário para tentar calar seus inimigos. Não precisam nem mesmo vencer um processo: os trâmites legais em si mesmos já têm um enorme poder disruptivo sobre o trabalho de pessoas que não vivem para a política e precisam se dedicar à vida real. Repórteres funcionários de empresas de comunicação podem contar com o setor jurídico para defendê-los nestes processos e seguir com sua rotina produtiva. Também não precisam pagar os custos judiciais. Repórteres amadores ou sem apoio institucional, por outro lado, são alvos fáceis para a intimidação jurídica.

Casos desse tipo de intimidação têm se acumulado. À medida que os canais disponíveis para a manifestação do cidadão se multiplicam e ganham influência, políticos e empresas — especialmente aqueles envolvidos em atitudes imorais, antiéticas ou ilegais — passam a combater a liberdade de expressão com o instrumento favorito dos canalhas: a Justiça. É lamentável que as leis possam ser usadas em prejuízo da democracia, mas o Estado de Direito ainda é preferível à barbárie. Cabe à sociedade fiscalizar e organizar-se para impedir ou diminuir esse tipo de tramóia.

Desde o primeiro processo iniciado contra a Corja, cristalizou-se em meu ponto de vista a necessidade de uma organização como a Electronic Frontier Foundation no Brasil. Seu objetivo seria a educação da sociedade quanto aos direitos e deveres do cidadão na Internet e também o apoio técnico e jurídico a repórteres amadores e demais vítimas de litigância de má-fé e outras injustiças. Um dia, quem sabe, a idéia sai do papel.