Como fazer re-apropriação inclusiva?

Este post foi agregado pelo meu lifelog. É possível que eu não seja o autor.

Passei o dia hoje refletindo sobre como conciliar dois processos essenciais mas ao mesmo tempo, aparentemente, incompatíveis: o DIY, a gambiarra, a liberdade de escolha, de auto-organização. O valor dos links, da criatividade, da possibilidade de novas re-apropriações de tecnologias. Das conversas, do conhecimento coletivo, da construção colaborativa, da riqueza da web, do fato de que agora usuários são produtores e o poder não está mais centralizado nas mãos de algumas poucas pessoas que retém o controle da mídia. Não está?

Do outro lado estão as pessoas que não entendem a Internet, que cresceram em um mundo de sala de aula, de provas, em um mundo de lógicas lineares, de papel e caneta, e muitas vezes nem isso. Num mundo em que na verdade mulheres devem cuidar dos filhos e deixar coisas importantes para os homens, como por exemplo computação. Num mundo em que aprender é sentar e perguntar, e não ler e ouvir . Um mundo muito mais feito de imagens do que de letras. Um mundo cheio de fraturas, de brechas, de exclusão. Mas também muito mais diverso.

E se acreditamos no primeiro processo, que o melhor caminho é que todos possam criar seus próprios usos, que não queremos que nossos artefatos venham com scripts prontos, que existe um valor no fato de que cada um (seja esse "um" uma pessoa, uma comunidade, uma cidade, um país) pode adaptar as tecnologias para seu próprio uso e benefício, de acordo com suas necessidades, o que acontece com aqueles que não sabem ou não estão preparados para desenvolver esses usos? E que tampouco tem uma rede a quem podem recorrer, ou que não sabem conversar, porque isso não faz parte do mundo onde eles cresceram? 

Há alguns anos, em uma conferência sobre SL, conversando com um dos fundadores do Ubuntu, eu disse para ele que acreditava que um dos problemas do Linux era que ele estava muito distante do usuário final, que era feito para usuários avançados, e que sentia que os usuários "comuns" tinham pouca voz dentro do sistema de desenvolvimento. A reação dele foi super enfática: de que dentro da comunidade o usuário tinha um papel fundamental e que ele adoraria que mais usuários se envolvessem no projeto, para que houvesse feedback, idéias e comentários sobre o que está sendo desenvolvido, o que seria mais interessante melhorar etc. Eu acreditei nele.

E acredito também que da mesma maneira como a Internet é teoricamente "aberta", participar de um projeto de desenvolvimento OpenSource também é. Mas a questão central é que nem todo mundo está preparado para trabalhar na lógica em que funciona esse desenvolvimento: as pessoas foram ensinadas a agir/pensar/fazer de outra maneira. E aqueles que não sabem ler, aqueles que pensam de outra maneira, aqueles cuja vida não permite a dedicação que o software livre demanda, o que acontece?

A Sonia escreveu um artigo muito interessante hoje sobre Inclusão Digital e o Enem, dizendo que focar as perguntas da prova em conteúdos, ao invés de habilidades, era uma medida inclusiva. Por que, para um aluno de escola pública, da periferia, é mais fácil estudar loucamente para decorar um conteúdo do que desenvolver habilidades lógicas que requerem todo um contexto de aprendizado e promoção de competências.

É mais importante saber resolver problemas que decorar a tabuada? Eu diria que sim. Assim como também acho importante incentivar as pessoas a criarem suas próprias soluções tecnológicas e descobrirem novos usos. Mas se em paralelo não existir uma preocupação com ser inclusivo, essa nova organização acabará por simplesmente transferir o poder das mãos de uma elite para outra. Como aconteceu na época da Revolução Francesa, lembram, dos nobres para a alta classe burguesa. E os pobres... continuaram pobres. Ou, ok, foram trabalhar nas fábricas.

Conclusão: INCLUSÃO digital. As pessoas aprendem sozinhas? Aprendem, um monte de coisas. Mas será que estamos caminhando em direção a um sociedade mais justa, mais igualitária, com mais respeito à diversidade? Quem está de fora? Quem NÃO está participando? São essas pessoas que me interessam.

Obs: muitas das reflexões acima vieram de uma interessante troca de e-mails com a Pi, a Lelex e a Tati. Tou sem o link delas agora, mas atualizo assim que conseguir.