Fiquei sabendo sobre o encontro Labtolab há alguns meses através de Victor Vina, que conheci no Mobilefest do ano passado. Como eu estava para começar o projeto Redelabs e vinha mantendo havia alguns meses uma conversa produtiva com o Conselho Cultural da Espanha em São Paulo, acabou surgindo o convite para participar do evento no Medialab Prado, em Madrid. Seria o segundo encontro de uma rede de Laboratórios de Mídia europeus, mas dessa vez com uma porta aberta para a América Latina. Aconteceria simultaneamente à primeira semana do Interactivos, um projeto que sempre quis acompanhar. Aceitei, de bom grado.
Na semana anterior ao evento, Jara Rocha do Medialab Prado me falou um pouco mais do formato, perguntou se eu toparia moderar um grupo de trabalho e me pediu para responder a um questionário. Respondi meio nas coxas porque estava com essa natureza dupla - levava o histórico da MetaReciclagem, mas também queria incorporar a reflexão de Redelabs que trata de assuntos paralelos. Outros participantes também responderam ao questionário no wiki, o que também me deu a chance de conhecer um pouco mais sobre o trabalho deles. Já comecei me perdendo com tantos nomes e contextos diferentes - e isso se repetiria durante toda a semana por lá, uma certa entropia que me deixou feliz.
Meu voo sairia no sábado, 5 de junho, no começo da tarde. Não daria tempo para eu pegar o ônibus direto de Caraguatatuba (a não ser que acordasse às seis da manhã para pegar o primeiro horário, e ficasse esperando mais quatro horas e meia no aeroporto). Fui para o aeroporto na sexta à tarde e fiquei em um hotel quase perto que oferece traslado gratuito. Gastei uns trinta reais a mais do que se fosse até a casinha em sampa, mas ganhei tempo para descansar. No café da manhã, cercado de gringos queimados de sol (indo embora) e de famílias brasileiras carregadas de muamba (chegando), fiquei pensando - mais uma vez - na ideia de fronteira, que me persegue como o sul perseguia um velho cego. Aquele espaço ampliado ali - aeroporto e arredores - é também uma fronteira, um espaço de limiar, troca e influência mútua. Me senti quase em casa.
Fui para o aeroporto cedo, despachei as malas e parei pra comer um açaí. Como manda murphy, acabei respingando na camiseta. Sorte que consegui encontrar uma loja brasileira lá dentro, com preços normais. Viajaria de verde. O voo foi tranquilo, apesar da comida insossa e do avião antigo da Iberia. Os filmes eram ruins (na verdade, nem lembro quais foram), mas fiquei lendo durante todo o trajeto. Não dormi nada, como sempre. Era um voo direto para Madrid, sem escalas. A única coisa que se destacou no avião foi que durante o pouso eles jogaram nas (velhas) TVs a imagem de uma câmera em cima do avião, talvez no leme. Beleza de pouso, com o sol que tinha acabado de sair. A alfândega foi fácil, apesar da tontura que o teto do terminal 4 do aeroporto de Barajas causava na minha mente já sentindo um começo de jet lag.
Peguei o metrô e troquei por um trem de cercanias. A paisagem na saída da estação de Atocha era meio fantasma, tão cedo em um domingo. Caminhei até o hotel Chic & Basic. Bem clean, com quartos apertadíssimos - muito mesmo, o quarto era do tamanho da cama - e um café da manhã ridículo (um saquinho de papel pendurado na porta do quarto com um croissant, uma garrafinha de suco e uma fruta). O pior não é nem o racionamento, mas a falta de uma rotina de convívio com outros hóspedes. Mas o wi-fi é de graça, e tem um terraço no sexto andar. E fica bem perto do Medialab Prado.
Tomei um banho, tentei descansar algumas horas, mas não rolou. Acabei aproveitando o dia quente para dar uma volta no Parque del Retiro, ouvindo música no celular - o último disco do Gogol Bordello, alguns Beatles, umas músicas da Cibelle. Encontrei um lugar na frente de um laguinho e me deitei. Me senti numa praia, com essa coisa de espaço livre, de troca, de contato entre pessoas diferentes. Saí pra andar de novo. Vi árvores crescendo no meio de um lago com água verde. Fui até o Palácio de Cristal - que abriga o importantíssimo banheiro do parque. Tentei me perder um pouco lá pelo meio dos caminhos arborizados. Depois tomei o rumo do hotel, já bem cansado. Um monte de Brasil pelo caminho, galera de roupa de praia, jogando bola, com bandeiras, essas coisas. Saindo do parque, senti Madrid meio como São Paulo, e não em um bom sentido - muita pose, imagem, cheiro de dinheiro, galera de carrão e relógio. Mas era domingo de sol, a amostragem não era justa.
Deitei um pouco no quarto, sem resultados. Saí de novo, para o outro lado. Encontrei um Museo del Jamon e parei pra comer um bocadillo de jamon e tomar un água. Dois euros e meio, maravilha. Já meio ansioso de jet lag, meio pirado de cansaço, passei em um chino para comprar suco, azeitonas e cogumelos em conserva, alguns biscoitos e salgados.
Dormi das 23h às 2h30. Li, escrevi, meditei, peguei meu saquinho de ração às quinze pras sete e subi pro terraço pra contemplar o sol que se esparramava em uma nova manhã. Seria o primeiro dia de Labtolab e Interactivos. Voltei pro quarto pra dormir mais três horas.