Colaboração online com o Drupal

Lá pelos idos de 2001, eu trabalhava em uma empresa de "capacitação corporativa". O trampo era fácil, me exigia poucas horas a cada dia, e eu passava o restante do tempo pesquisando minhas próprias coisas. Na época eu já tinha desistido de trabalhar com publicidade, e estava mais interessado em criatividade, redes de inovação e aquela coisa toda de gestão de conhecimento (que hoje me parece muito mais um tipo de exploração de mão de obra intelectual, mas deixa pra lá). Tinha idealizado um sistema online que permitiria a pessoas em um mesmo ambiente de trabalho compartilharem com as outras o que encontravam na internet em sua navegação cotidiana. Até tentei propor algumas coisas pros clientes do trampo, mas nunca encontrei muita resposta. Continuei pesquisando sozinho: fiz um blog e mostrei pra algumas pessoas.

Um dia, alguém (infelizmente, não lembro quem foi) comentou no blog sobre um trecho de um livro que estava disponível em um site norte-americano. Fui lá pra ler. Era o capítulo do Emergência no qual o Steven Johnson explicava o funcionamento do slashdot. Achei fantástico, porque resolvia algumas das questões que eu tinha na época, sobre como descentralizar a moderação de sistemas online.
Segui pesquisando, penei tentando instalar o sistema do slashdot, e acabei desistindo quando encontrei um similar que rodava em zope. Baixei o Zope Book e li inteiro em alguns dias. Acabei achando bem complexo o sistema, mas foi interessante pra conhecer outros sistemas de gestão de conteúdo que se propunham a fazer wikis e outras coisas que até então eu não conhecia. Fiz até uma versão do meu blog, o joelhasso, direto no zope. Mas desisti quando percebi que os serviços de hospedagem em zope eram raros e caros. Alguém me deu o toque de procurar sistemas em PHP, que podiam ser hospedados em qualquer host de 10 reais por mês, e por aí eu fui. Brinquei com o phpnuke, com o postnuke, também com alguns sistemas de blog como o b2, nucleus e até uns sistemas de wiki, como o phpwiki. Um dia, instalei um pacote, acho que francês, pra instalar no windows o apache, php e mysql tudo de uma vez só. Ele vinha com um CMS pronto para instalar. O CMS se chamava drupal. Li um pouco sobre o drupal e sobre o drop.org, achei a proposta interessante e fui testar o sistema. Decepção total: não encontrei muita documentação, o sistema não tinha nada pré-configurado. Nada acontecia sozinho. Deixei de lado por alguns meses.

Nesse meio-tempo, um monte de coisas acontecendo: a lista de discussão que eu tinha criado com o Hernani bombou e coloquei no meu servidor um phpwiki pra galera anotar coisas. Isso virou o projeto Metá:Fora, que um dia criou a MetaReciclagem. No meio de tudo isso, voltei a brincar com o drupal, com um pouco mais de paciência. Duas coisas me atraíam nele: a estrutura de nodes, que armazena qualquer tipo de informação praticamente da mesma forma; e as taxonomias, que eram muito mais potentes do que as categorias de outros sistemas. Dentro do Metá:Fora, o Felipe Albertão fez o metaong com o drupal, e eu cheguei a montar algumas coisas também: o site emergencial pro festival Mídia Tática Brasil, o site que fizemos pro workshop na Cidade Tiradentes e mais umas experiências.
Depois do fim do projeto Metá:Fora, numa noite longa, eu criei o Liganóis, que foi uma experiência muito interessante: um site totalmente autônomo que começou a atrair pessoas de projetos de inclusão digital. A partir daí, eu já me considerava um drupaleiro. Mesmo que montasse sites com outros sistemas, mesmo que continuasse usando o wordpress pros meus blogs, eu sempre acabava voltando pro drupal. Fiz uma dúzia de pequenos sites com ele. Tive um grande momento de decepção, depois que montei o Conversê e ninguém da equipe sabia raquear o drupal. Eu tinha um monte de idéias pra ele, até um chat por jabber dentro do browser, meio ano antes de surgir o google chat. Tinha montado uma estrutura com grupos e tags, e queria aproveitar ao máximo todas as possibilidades de cruzamentos da estrutura de usuários, nós e taxonomias. Mas, como com qualquer sistema, sem ter codeirxs dispostos a entender e atuar ali dentro, não rolava. O site chegou a ter cinco mil usuárixs cadastradxs, mas era tão bugado que me dava vergonha. A situação foi se arrastando até o fim do contrato, e ele foi felizmente cortado. Fiquei decepcionado e deixei o drupal de lado uma vez mais.

No começo do ano passado (alguns meses antes de estourar a coisa do friendfeed), eu saquei que só pelo fato de usar diferentes sistemas que geravam feeds RSS, poderia montar um agregador pessoal, onde eu também pudesse blogar e estruturar informação. Aí voltei a olhar pro drupal. Eu lembro que houve uma época há dois ou três anos em que o Movable Type restringiu o uso gratuito de seu sistema, e se falou que muitos desenvolvedores de módulos extras migrariam para o drupal. Não sei bem se é por isso, mas essa minha reaproximação com o drupal no começo de 2007 foi muito surpreendente: o sistema estava fácil de entender, a instalação era simples, e havia centenas de módulos extras. Mais do que isso, vários recursos que eu penava pra rodar com módulos obscuros em versões anteriores, como as Tags, estavam agora disponíveis no core. Montei meu agregador feliz. Cheguei até a subir um site em drupal pra MetaReciclagem, mas na época não mexi muito nele. Até o fim do ano passado, na verdade, fiquei fazendo outras coisas, meio distante da administração de sites.

Até que, no começo desse ano, comecei a trabalhar no weblab. E o primeiro desafio lá dentro foi elaborar um site colaborativo para um projeto fantástico, a Rede Humaniza Sus: em resumo, são pessoas em todo o Brasil que trabalham com a política nacional de humanização do Sistema Único de Saúde. O projeto contaria com uma primeira etapa de sensibilização presencial (ativação, nas palavras do Dalton), e depois as pessoas iam continuar conversando através de uma lista de discussão e de um ambiente colaborativo. O ambiente, foi decidido, seria feito com o drupal. Voltei a estudar o sistema, e entendi o que outras pessoas já haviam comentado: CCK e Views (e, aprendi em projetos posteriores, também o panels e o OG) expandem ao infinito as possibilidades do drupal. Com a ajuda dos garotos chuvosos, montamos também uma estrutura de fila de moderação coletiva inspirada em sites como slashdot, kuro5hin e o brazuca Overmundo. Um grande desafio desse sistema também estava na ponta presencial: traduzir todo o potencial colaborativo e de ação em rede pra pessoas que não estavam por dentro de toda a conversa de software livre e licenças abertas. Fiquei (e ainda estou) muito satisfeito com o projeto, porque foi a primeira vez em que tivemos a possibilidade de implementar na prática todas as ferramentas colaborativas que podíamos imaginar, além de poder contar com reforço conceitual nos encontros presenciais que o Dalton tocou, e ainda por cima com desenvolvimento estruturado. Um pouco dos resultados podem ser conferidos aqui.

Eu ainda estou aprendendo um monte sobre o sistema (também no ambiente de edição aberta pro Mutirão da Gambiarra) e todas as possibilidades dele. Estou mexendo com mapas, fazendo wikis, subcomunidades, e mais um monte de coisas. Toda semana aparece mais algum módulo interessante: minha paixão mais recente é o drupal shell.