O primeiro encontro presencial propriamente dito dos Bricolabs, dentro da programação do wintercamp, foi muito importante. Mais do que finalmente conhecer algumas pessoas com quem converso há mais de dois anos, compartilhar o cotidiano por cinco dias foi interessante pra dar uma dimensão das aspirações, sonhos e possibilidades dessa rede. Algumas idéias que antes pareciam meio soltas no espaço passaram a fazer sentido. Pessoas que não confiavam muito umas nas outras (talvez um traço comum de pessoas pós-enredadas ou post-networked) foram aos poucos abrindo sorrisos e as portas de seus imaginários e casas.
Ao contrário de algumas outras redes que tinham uma agenda bem definida e objetiva, nos demos a liberdade de esvaziar o copo antes de começar a servir. Rob van Kranenburg moderou o processo, começando com questões diretas a todxs e juntando as respostas no flipchart: o que somos, que nos falta, o que queremos, etc. Chegamos a algumas bases comuns sobre a natureza da rede, princípios de relacionamento e descentralização. Houve alguma tensão por conta de maneiras diferentes de entender as coisas e atuar, mas fiquei feliz porque no fim estávamos bem alinhadxs.
Não por acaso, muitas das conclusões a que conseguimos chegar se aproximam bastante dos formatos da MetaReciclagem, mas isso pode ser só minha visão bitolada. Alguns desses elementos: a não-incorporação, a autonomia local, a não-exclusividade e um certo DIY em rede - se precisa de uma carta de recomendação da rede, redija-a e peça pra outrx bricolabeirx assinar. Também chegamos a trabalhar um pouco em sites de alguns projetos, definimos algumas ferramentas de validação da rede que podem ser úteis em contextos locais e começamos a debater a refatoração do site.
Ao fim de todas as conversas, chegamos a traçar alguns planos e prioridades de projetos:
• Encontros presenciais: captar recursos e encontrar oportunidades de encontro. Por exemplo, trazer algumas pessoas para o encontrão transdimensional de MetaReciclagem, em setembro.
• Tailabs - projeto taiwanês para desenvolver rapid prototypers de baixo custo. Eu pedi ajuda pra fazer uma em sampa e colocar na mão do Glauco...
• Bricophone - articular e espalhar o projeto do Jean-Noël e do Philipe. É possível que eles venham ao Brasil no segundo semestre (talvez Arraial - Sampa - BH). 2009 é ano da França no Brasil ;). O projeto recebeu apoio da nlnet. Eles estão atualmente definindo protocolos e operação em rede, e pensando em como começar a criar clientes de conversação para uma arquitetura sem fio, mesh e p2p. Eles têm um puta domínio técnico, e Philipe tem alguns equipamentos interessantes no tmp/lab.
• Ata - projeto tocado na Colômbia pela Vanessa, e articulado junto com Patrick Humphreys da London School of Economics e Vicky Sinclair de Manchester. A ideia é um jogo distribuído baseado em conhecimento livre sobre a questão da água. Uma possibilidade é juntar com o outro projeto do Jean-Noël, da máquina de lavar roupas open-source.
• Zero Dollar Laptop - projeto tocado por James Wallbank do Access Space de Sheffield - campanhas e workshops sobre a reutilização de laptops usados, na linha do manifesto que ele publicou em 2007.
• Um livro sobre sobrevivência e autonomia, talvez inspirado pelo livro em quadrinhos do Access Space. Vicky também comentou algo sobre um livro que está organizando com um pessoal do Brasil.
• Traduções de textos importantes EN-PT_BR. Mutirão nessa ;)
• Venhza Christ, da Indonésia, propôs a participação de bricos no Cellsbutton em agosto, e workshops com a população local focados na produção de coisas como alternativa econômica para PNEs.
• Refatorar o site, com perfis de usuário e agregadores (já vi isso ;)).
O último dia era reservado para apresentações de 20 minutos de cada um dos grupos. A apresentação dos bricolabs foi uma das mais críticas do evento. Apesar de ser um evento de redes, as apresentações eram em um auditório, com todos os elementos de sempre: platéia no escuro, telão, palco iluminado, sistema de som e microfones de acesso restrito. Quando chegou nossa vez, ninguém foi ao palco. Um cartaz do wintercamp, que originalmente retratava uma rede de distribuição (e não de circulação), com um monte de pontas desconectadas entre si, tinha sido modificado com ferramentas diversas e alguma colagem: as pontas foram interconectadas.
Esse cartaz foi exposto no púlpito. De repente, uma voz ao microfone, não identificada, perguntava "onde está nosso líder?" Depois, continuava "como vocês podem ver, nós não temos uma liderança clara". A partir daí, três ou quatro pessoas no meio do auditório falavam sobre como não precisávamos nos encaixar nos padrões das outras redes. Em determinado momento, perguntou-se "quem aqui está na bricolabs", e pessoas de diferentes redes participantes do wintercamp levantaram a mão. A lógica é: não temos muros, estamos em muitas dessas redes, e não precisamos determinar limites. Eu cheguei a falar que não queria ser mal-educado, mas as perguntas que o evento propunha para as redes estavam ultrapassadas: "como fortalecer as redes" não é mais uma questão válida. As redes são fortes, e não precisam da bondade dos figurões para nada. Mais tarde disseram que eu peguei pesado, mas algumas pessoas vieram me dizer que alguém precisava falar isso.
No fim das contas, fiquei feliz de ver que existe alguma coisa na bricolândia, apesar da enorme quantidade de lurkers oportunistas que tem lá (mais ou menos a mesma quantidade de outras listas, mas são pessoas com um potencial de atuação muito acima do normal). Senti falta de algumas pessoas lá, mas valeu.
PS.: mais uma vez, como durante o encontrão intergalático, certa noite o ambiente (ou os preços altos do bar ao lado) fez algumas pessoas saírem para buscar cerveja. Na mesma noite, os ráquers do dyne haviam pedido para usar a sala dos bricolabs à noite, porque a deles não podia abrir à noite.O resultado: