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"Mr. programmer
I've got my hammer
Gonna smash my, smash my radio!"
Ramones, We want the airwaves
"Para explicar como as forças astrológicas poderiam produzir ação à distância, Mesmer postulou um fluido sutil que ele chamava fluidium, um meio diáfano que comunicava vibrações lunares para as marés da mesma forma que possibilitava que Venus e Júpiter ajustassem os destinos humanos. O fluidium tomava forma no conceito Newtoniano de éter, um fluido invisível que permearia o espaço e serviria como meio estático para a gravitação e o magnetismo, bem como sensações e estímulos nervosos. Para Newton, o éter servia para explicar como os corpos distantes do sistema solar comunicavam-se uns com os outros, e ao mesmo tempo livrar-se da abominável ideia de um universo em que existisse o vácuo."
Erik Davis, Techgnosis
Eletrônicos equipados com wi-fi são geralmente vistos somente como dispositivos de acesso à internet. Entretanto, assim como Brecht propôs para o rádio, é possível pensar em um uso alternativo das tecnologias sem fio para a criação de redes informacionais locais, não conectadas à internet e que não dependam de uma infra-estrutura centralizada. O acesso ubíquo à internet tem certamente um aspecto de integração, mas por outro lado também traz uma grande alienação do sentido de local: cinco pessoas sentadas em um café acessando seu email ou orkut com wi-fi são cinco pessoas mantendo-se alheias uma à outra e ao entorno. É certamente possível argumentar que essas cinco pessoas podem usar a internet para acessar informação local, mas é raro que tentem. Mesmo quando buscam esse tipo de informação, acabam buscando em estruturas centralizadas como o google ou a wikipedia.
Um dos conceitos fundadores da rede Bricolabs foi o de infra-estruturas genéricas de informação (generic information infrastructures). Em essência, tratava-se de adotar padrões abertos de comunicação para a criação de redes para usos múltiplos e não determinados, fazendo uso de dispositivos genéricos de informação (os GIDs, generic information devices) e tratando de incentivar a apropriação de possibilidades técnicas e como implementá-las. Buscava-se delinear estratégias para o desenvolvimento de ciclos de inovação baseados em informação livre (hardware aberto, software livre, espectro aberto e conhecimento/cultura livres). Foi a partir desse posicionamento que a Bricolabs conquistou o apoio e participação de pessoas e coletivos em todo o mundo que atuavam em projetos que compartilhavam dessa perspectiva, além de ter criado campo para o desenvolvimento de projetos relacionados, como o Bricophone.
Em todo o mundo, a tensão entre a liberdade na rede e as políticas de controle usando pretextos diversos - pirataria, pedofilia, etc. - chama a atenção para uma questão hipotética mas ainda assim presente: o que acontece quando alguém puxar a tomada da internet? A estrutura de domínios, que dá identidade à rede permitindo que as pessoas saibam como acessar os sites de outrxs, é controlada por uma organização norte-americana. A criação de infra-estruturas genéricas e autônomas, além de objetivamente possibilitar arranjos de rede diferenciados, também atua no sentido de desenvolver estratégias de sobrevivência para o pior cenário.
Rob van Kranenburg, um dos criadores da Bricolabs, publicou pelo Institute of Network Cultures de Amsterdam um ensaio chamado "The Internet of Things", em que chama a atenção para a necessidade de combater o hábito da indústria de TI em encapsular o conhecimento que embarca no desenvolvimento de seus produtos. Para fazer frente a essa tendência, é vital que se criem espaços de experimentação técnica e social, em que seja possível explorar (mesmo que à força) a indeterminação potencial dos mais variados dispositivos eletrônicos de comunicação. Esses espaços têm emergido em todo o mundo, atuando em rede e construindo ciclos de aprendizado e inovação que passam longe das estruturas tradicionais. No Brasil, uma dessas redes é a MetaReciclagem, que conta com algumas centenas de integrantes e dezenas de projetos e espaços.
Autonomia em rede
Desde que a MetaReciclagem começou a ser articulada, em 2002, alguns de seus integrantes tinham a intenção de desenvolver redes sem fio autônomas baseadas em hardware remanufaturado e software livre, mas só recentemente os equipamentos para conectividade wi-fi têm se tornado mais acessíveis. Hoje e possível retomar essa intenção original da MetaReciclagem, buscando as referências da rede Bricolabs e do projeto mimoSa, e aproveitando o conhecimento compartilhado por projetos como Burnstation, Freifunk, Guifi, Hive Networks e RedeMexe.
O núcleo Desvio propõe, nesse sentido, o desenvolvimento de zonas autônomas sem fio (ZASF), um conjunto de soluções de hardware e software para a criação de redes wi-fi autônomas para diversos usos experimentais e informacionais. É uma ação de uso crítico de tecnologias cada vez mais abundantes para a criação de zonas autônomas sem fio.
Um aspecto técnico do wi-fi - a criação de redes "ad-hoc", de ponto a ponto - pode ser estendido para a criação de redes mesh, em que cada equipamento conectado torna-se também parte de uma infra-estrutura compartilhada de rede. O projeto ZASF articula a implementação dessas redes com uma reflexão sobre algumas polaridades que emergem: criação de sentido local ou dissolvência na internet; compartilhar e acessar informação livre ou ensinar e aprender a partir da descoberta e do desafio; usar ferramentas comerciais remotas ou manter serviços de rede no próprio computador; etc.
Uma possibilidade ainda pouco explorada é o reuso de hardware para estabelecer as redes autônomas. Qualquer computador feito nos últimos dez anos é mais do que suficiente para oferecer serviços de rede como servidor web com sistemas colaborativos de gestão de conteúdo - wikis e blogs; servidor de chat e mensagens instantâneas; armazenamento e acesso de arquivos de mídia e documentação; e até serviços de stream de áudio e vídeo. Os aspectos de descentralização e auto-replicação das redes mesh também são estendidos ao projeto através da disponibilização de documentação e de todo o software necessário para a criação de redes semelhantes em outras localidades e contextos.
Na prática, o protótipo de ZASF é uma rede mesh localizada em espaço público, e acessível a qualquer dispositivo que queira se conectar a ela. Uma vez dentro da rede, qualquer tentativa de navegar na internet direciona o dispositivo para um site local, que dá acesso aos diferentes serviços disponíveis - wiki aberto, chat, diretório de mídia compartilhada, documentação técnica e conceitual sobre a própria rede, tutoriais e software para replicação, etc. Dependendo do contexto, a rede pode oferecer conteúdo específico, atuando como totem wireless ou espaço de informação.
Documentando
Vamos publicar toda a documentação relacionada ao projeto ZASF na
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