Conversa com Cesar Harada

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http://culturadigital.br/redelabs/2010/09/conversa-com-cesar-harada/
--- No começo do ano, eu estava dando uma vasculhada no site do projeto Opensailing, que concorria à premiação do festival Future Everything. Já tinha ouvido falar dele, e pareceu que podia ter alguma relação com o cenário aqui em Ubatuba. Resolvi entrar em contato com Cesar Harada, idealizador do projeto. Cesar é um francês de ascendência japonesa que desenvolveu seu mestrado no RCA, em Londres, e depois recebeu uma fellowship do TED (entre outras conquistas). Ele respondeu-me entusiástico, dizendo que me conhecia – havia assistido à apresentação que fiz no RCA com Ruiz e CV, há uns dois anos. Falou que admirava as posições e táticas da MetaReciclagem. Na época, ele estava em Londres desenvolvendo protótipos para o Opensailing. Quando eu comecei a pesquisa redelabs, comecei uma conversa/entrevista com ele. Cesar estava no Quênia desenvolvendo a World Environment Action, e a caminho de Boston para começar a trabalhar em um laboratório do MIT. Nossa conversa já começou com uma mudança:
Cesar Harada

Cesar Harada

Cesar: Eu acabei de me demitir, ontem (07/07), de uma posição na Escola de Arquitetura SENSEable City Lab (MIT), mas me ofereceram outra vaga no departamento de artes do MIT Media Lab a partir de outubro até janeiro de 2011. Mas eu não sei mais quão relevante isso é. Eu quero focar em oceano e pesquisa, não na mídia que cerca isso. efeefe: Como o Media Lab do MIT difere do que se pode encontrar em instituições em Paris e Londres? Cesar: A cena de arte e mídia em Paris e na França em geral são bastante apoiadas pelo estado. A arte que sai de lá é muito oficial e “antiquada”. Ela precisa de alguma maneira ter uma conexão com a história da arte ou referências fortes. Uma comunidade underground no Ministério da Cultura está sempre fazendo exposições extravagantes com dinheiro maluco. A arte e mídia na França é em grande parte financiada pelo DICREAM e museus públicos locais como  Le Cube e o 104. Existe um pequeno grupo emergente de coletivos underground que fazem cada vez mais movimento como a Ars Longa, e uma cena squat bem underground está surgindo também, mas crescendo muito devagar. Então Paris é em grande parte institucional e muito intelectual, crítica, enraizada na filosofia francesa. Em Londres é muito diferente. A cena de design interativo é muito mais comercial. Na arte-mídia existem umas poucas instituições que podem bancar prospecção, mas elas são muito boas. A cena de arte britânica em geral é muito mais provocativa e mais rasa do que a francesa, mas também mais dinâmica e mais ligada ao mundo da mídia do que ao mundo da arte. Nos EUA o Media Lab está quase totalmente incorporado à indústria. No laboratório onde eu trabalhava, nenhum projeto é independente. Cada projeto tem um financiador externo. Com exceção de poucas e ótimas exceções, o Media Lab do MIT é extremamente comercial e apoiado comercialmente. O melhor exemplo é o próprio motivo da minha saída. O laboratório me pediu para desenvolver uma tecnologia para limpar a mancha de óleo [do vazamento no Golfo do México]. Eu projetei máquinas para limpar o vazamento de óleo. Mas eles queriam me forçar a trabalhar com uma nanotecnologia que só estará disponível depois de 2020. A ideia deles era pegar 20 milhões de dólares, dividir entre dois laboratórios e desenvolver o conceito das máquinas, em vez de soluções reais. O laboratório estava recorrendo a fundos de emergência para levantar recursos para uma tecnologia que não era adequada para solucionar emergências. Mas eles não se incomodam em usar dinheiro de pessoas que estão passando por problemas agora. Eles só querem associar arte e ciência, aparecer e ficar ricos rapidamente. Então eu decidi que estava mais interessado em ter impacto real no meio ambiente. Então estou saindo para tentar desenvolver eu mesmo a tecnologia. Porque o Media Lab trabalha com mídia, não mais com ciência. A política do laboratório de cidades SENSEable do MIT é extremamente proprietária. No momento que eu entrei lá, tive que assinar um papel dizendo basicamente que minha alma pertence ao MIT. Meu coordenador tenta patentear todas as nossas ideias, fazer o máximo possível de dinheiro, mesmo em projetos humanitários… Então, acho que você pode entender por que eu estou tão feliz de sair. Eu estava no ninho de cobras. Eles são loucos, totalmente o oposto da MetaReciclagem. São tão antiquados em seu jeito de fazer negócios! Além disso, o MIT é incrivelmente hierárquico. Eu era coordenador de pesquisa, dando ordens para dez pessoas. Isso não é o meu jeito de fazer as coisas. Eu sou mais distribuído, gosto de tratar as pessoas como humanos, não como escravos. Então eu posso dizer com confiança que o Reino Unido é o mais voltado para o futuro (ficção – 2030), a França é orientada à arte (salto poético a 2020) e o MIT é incorporado ao mercado (2011). Minhas expectativas do MIT eram totalmente diferentes. Eu estou desapontado por eles serem tão antiquados. Eles têm excelentes ideias, mas não desafiam estruturas sociais, e não pensam além daquilo que a indústria deixa eles pensarem. No fim das contas, eu aprendi um monte. Eu ficaria muito feliz em ajudar a construir, por exemplo, novos modelos de laboratórios no Brasil, se o tempo permitisse. Eu entendo que o MIT Media Lab parece muito bom, olhando de fora. Mas acredito que há muitas outras (e melhores) formas de organizar uma estrutura social para produzir inovação. Eu vim ao Media Lab pensando nele como uma casa de produção. Acredito que teria sido melhor se eles estivessem trabalhando mais colaborativamente e de forma mais aberta. Além disso, o fato de que eles têm ligações tão fortes com a indústria os transforma em agências de publicidade semi-corruptas. Então, acredito que existem um monte de coisas para aprender com o MIT, mas por outro lado muitos vícios podem ser evitados com nossa forma de pensar – algo como um híbrido de MetaReciclagem, Open Sailing e Media Lab – uma entidade estranha. Um exemplo interessante que eu encontrei é o Kitchen Budapest. Eu só ouvi coisas boas sobre eles: Cada pesquisador tem um pagamento fixo. Cada pessoa passa 80% do tempo em projetos pessoais, 15% em colaboração, 5% para o laboratório em geral. Muito produtivo, um monte de diversão, espaço aberto, bom relacionamento com a indústria, políticas open source, tudo de bom!

Há duas semanas, Cesar me mandou outro e-mail:
A situação no Golfo estava OK até o fim de agosto, mas eles pararam grande parte do esforço de limpeza do mar porque a mídia está ocupada com outras coisas… eu estou no momento em Seoul, na Coreia, trabalhando em um protótipo para a máquina de limpar óleo. Encontramos também um patrocinador e alguns contatos interessantes – assim espero.